Pesquisar este blog

quarta-feira, 18 de maio de 2022

Duas Brahmas e Um Ensopado de Búfalo

Tenho dois hábitos de vida toda, não importa onde esteja:
1- caminho, mas caminho muito; meus pés ensinam ao cérebro a geografia do local onde esteja, é a conexão
2- quando canso, entro num bar e bebo e bebo muito, até o cérebro desconectar
Normalmente faço isso quando estou só e minhas melhores viagens foram feitas na solidão, logo não levo problemas, nem os crio. É só solução… e alguns soluços eventualmente.
Uma vez estava em San Francisco, California, que vocês sabem é que nem Porto Alegre, pois a cidade começa no porto, “downtown” e sobe pela Borges de Medeiros, digo Market Street -até hj não entendi pq a Borges não se chama rua do Mercado. Quando estava começando a cansar aparece um “junkie” e pede: “hey bro, can you spare 20 thousand Dolars..?” Ri, meti a mão no bolso, peguei uma moeda, atirei pra ele e notei que ele estava em frente a um bar que dizia no letreiro: “mais de 480 cervejas do mundo todo”. Pareceu um bom lugar pra beber umas.

Entrei, olhei o pequeno bufê, onde notei um ensopado de búfalo e pensei: “vou encher a cara e depois comer isso, que na certa vai me dar aquele desarranjo, mas vou poder um dia contar a história de que enchi a cara num boteco que vendia 480 marcas de cerveja e onde comi um ensopado de búfalo que deixou memória”. Você pode não acreditar, mas no interminável cardápio de cervejas tinha até Brahma Beer. Eu, do outro lado do planeta, só e abandonado, sem eira nem beira, apenas com solado pra andar outro tanto e chutar as latas pelo caminho, gostei e fui ficando. E bebendo. Até o cérebro desconectar.
É o momento em que saio do corpo e viajo. Fica ali no balcão aquele corpanzil inerte, mas a imaginação viajando pelo cosmos qual um Gagarin tupiniquim. Até que, pelas tantas, ouço em meu ouvido: “Marco Aurélio”. Pensei fazer parte da viagem, já que a possibilidade de alguém ter esta informação privilegiada, do outro lado do planeta é nenhuma, nem despertei, mas a requisição se repetiu: “Marco Aurélio”. Pombas, só minha mãe me chamava assim, afinal foi ela quem me deu esse nome ao convencer meu pai que preferia Marco Antonio, argumentando que este último era um grande General, mas o primeiro foi Imperador.
E no terceiro “Marco Aurélio” decidi despertar. Faço isso amiúde, pois me nego a sair do torpor, cujo investimento foi alto, a menos que a situação realmente pareça séria, como era o caso. Uma vez, no extremo sul da ilha de Santa Catarina aconteceu o mesmo, até que lá pela terceira vez que ouvi meu nome despertei ao chamado do Gilberto Simões Pires e aquele seu vozeirão característico, ele que ama Floripa e gasta boa parte do ano por lá. Era um daqueles locais em que você espera uma eternidade por uma mesa, enquanto isso bebe trocentas caipirinhas e gasta uma fortuna, como todos os pontos afamados da ilha da magia.
Mas voltando a San Francisco e ao “Marco Aurélio” -só ex-colegas me chamam assim desde que mamãe deixou este mundo- despertei e olhei pra trás e vi o filho do seu Olavo. Quais as chances de isso acontecer? Você estar em outro hemisfério, sozinho, enchendo a cara num boteco desconhecido e o filho do bedel do colégio onde estudou te reconhecer e vir falar contigo? Pois é, essas coisas acontecem comigo.
Ele contou que morava e estudava do outro lado da baía, em Berkeley, mas veio até ali matar as saudades de uma Brahma Beer. Foi o que bastou. Chamei o garçon e pedi: “duas brahmas e um ensopado de búfalo”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário