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segunda-feira, 24 de junho de 2019

Noite de São João em Outros Tempos

No século passado esta seria uma segunda-feira pra pedir uns Pilas ao pai, antes dele sair para o serviço e, à tarde, pedir à mãe pra nos levar na Caramuru, ali na Cristóvão Colombo. “Caramuru, os Fogos que NÃO dão chabu…” dizia a propaganda. Levou anos para que mamãe permitisse comprar algo mais estridente que os inocentes “Estalinhos Bebê”, que de tão inofensivos podíamos estourá-los num estalar de dedos. Mas a gente foi crescendo e, apesar de ainda precisar pedir as merrecas pro pai, já saímos com os amigos pra comprar fogos, pois alguém sempre conhecia algum armazém onde havia os temidos “Cabeças de Negro”. Tudo isso pra estourar na Festa de São João, ao redor da fogueira, ao som de música alta e sempre tentando um quentão, pra acompanhar a pipoca e o pinhão. 
As fogueiras, cada vez mais altas, eram vistas nas praças de cada bairro ou clube e, se estivesse na estrada, podia-se avistá-las na entrada de cada cidade. Não é porque eu fosse pequeno que tinha a impressão de que elas eram tão altas; elas eram grandiosas mesmo. Tudo começava com um poste conseguido junto à CEEE. Naquela época os postes eram todos de madeira e a estatal de energia elétrica possuía lavouras de eucalipto para seu abastecimento. Só que aqueles postes têm vida útil limitada, pois a parte da madeira que é enterrada apodrece e eles precisam ser substituídos por novos. Os antigos, eram os alvos das associações de bairros, clubes, escolas e prefeituras para as festas juninas, enterrados no local da festa e em volta eram atirados pneus, restos de construções, galhos secos e tudo o mais que fosse inflamável.
Naquela época fazia frio em Junho, portanto estar perto de uma enorme fogueira em chamas era um bom programa e, quando mais ao fim da festa a estrutura ruía, era hora de pular o braseiro que ocupava uma imensa circunferência em meio ao ambiente da festa. Claro que esta proeza não era facultada aos piás, pelo risco envolvido, mas aos mais taludinhos e, invariavelmente aos tiozãos tchucos de tanta canha com quentão. Esses fatalmente terminavam a noite visitando o Pronto Socorro, com dedos a menos nas mãos pelo vacilo em alguma explosão de rojão, ou queimaduras generalizadas pelo corpo, depois de caírem na fogueira. Todos os anos assistíamos ao Flavio Cavalcanti implorando em seu programa de Domingo à noite para que as pessoas não brincassem com fogos, mas o noticiário do dia 25 era um rol de queimados e pessoas que perderam partes das mãos nas festas. 
Eram tempos mais leves e os guris se divertiam muito no dia seguinte à festa, aprontando com as bombas que sobraram. Encontrar um descampado onde se explodiam os Cabeças de Negro com latinhas vazias, só pra ver quantos metros aquilo subia no céu. Eu, de exibido, levei ao colégio pra mostrar aos colegas, quando o Nelson me dedou ao Seu Olavo e lá fui eu fazer minha primeira visita à diretora, Dona Wilma que, atenciosa como sempre, pediu que eu não levasse mais fogos para a escola. Em casa, o couro comeu, pois o Xerife havia carimbado uma mensagem, no meu Caderno de Deveres, para minha mãe assinar e ficar ciente do ocorrido. Depois de me aquecer com aquela imensa fogueira na noite de São João, na noite seguinte foi vez de esquentar antes do banho, com o couro da cinta de papai, habilmente manuseado por minha mãe. Outros tempos

sexta-feira, 14 de junho de 2019

Piada Errada e Uma Coincidência Nefasta

   Entrei no imponente local de eventos, depois de deixar a possante com o “valet” e me dirigi à “promenage”, onde cheguei me apresentando da seguinte forma: “boa noite eu sou o pai da noiva”. Foi o que bastou para aquelas recepcionistas em forma de deusas me tratarem com uma reverência que eu gostaria ter tido de alguma das minhas esposas. Ato contínuo destinaram alguém para me conduzir ao lugar a mim reservado e assim fui entrando e vendo uma decoração de flores e luzes que deve ter custado um barco a motor, com Comodoro e sereias. Comecei a ficar impressionado e ligeiramente preocupado, até que fui chegando ao local que deveria a mim ser reservado e notei que não conhecia pessoa alguma e que a decoração não combinava com a da formatura de minha filha.
   Sim, foi uma infeliz brincadeira minha que coincidiu com o fato de eu estar no lugar errado, nos altos de Belém Velho, desconhecido por mim até no claro do dia, que dirá àquela altura da noite. Eu estava no local errado, no evento errado e tinha lançado mão da piada errada. E agora, como fazer o tempo voltar atrás??? Tratava-se mesmo de um casamento e toda equipe de suporte acreditou que eu era o pai da noiva.
   Só me restou sair de fininho dizendo que tinha esquecido as alianças no carro e me fui em direção à saída. Agora quando cheguei lá e pedi o carro de volta ao coordenador da equipe de “valets” disse que tinha mto automóvel no pátio e que iria demorar pra buscarem o meu de volta. Por sorte apareceu o largador para quem eu tinha entregue as chaves da possante e ele lembrava onde a tinha guardado. Desci com ele pelo interminável estacionamento, entramos no carro, ofereci uma gorjeta e lá fui eu procurar onde raios ficava a casa de eventos em que acontecia a festa de formatura de minha filha.

quarta-feira, 12 de junho de 2019

Dia dos Namorados

Originalmente publicado em 12/6/2015
Ela insistia, gostava, achava normal caminhar comigo de mãos dadas, com os dedos entrelaçados. Eu não, apenas, não gostava como morria de vergonha que me vissem naquela situação. Sempre gostei de andar de mãos dadas de conchas; assim foi com meu pai, com minha mãe e com as meninas mais tarde. Jamais tinha visto um pai andar de dedos entrelaçados com o filho, ou filha. Ao mesmo tempo eu gostava de me exibir caminhando com o braço por cima do ombro dela. Loira, alta, praticamente a exibia como um prêmio. Coisa da criação machista desse sul de mundo latino em que nasci e cresci.
Apesar disso fui amadurecendo e aprendendo a tratar das coisas do amor e da relação em casal. Conceder e avançar é a regra do jogo. É o que os namorados fazem até se decidirem um pelo outro definitivamente. O problema é parar de fazer isso quando tomaram a decisão e deram o passo mais definitivo e depois parar de jogar, deixar de conceder e avançar sempre. Entrar na monotonia, na rotina e não conseguir mais avançar, por ter perdido a habilidade de conceder. É preciso arriscar, mesmo que você tenha medo de perder. Friozinho na barriga é obrigatório para trazer novas emoções. Velhas emoções são boas pra álbum fotográfico, ou pra contar aos netos. Mas uma relação entre duas pessoas que se amam, precisa ter sempre emoções novas. Elas são o combustível que vai manter o motor da relação andando. Portanto não se acomode.
Quando se viaja pelo mundo e se conhece gentes e culturas diferentes, se aprende formas diferentes de amar entre as pessoas. E se aprende que o importante é deixar de lado os preconceitos e frescuras e não ter medo de demonstrar o que sente. Passeando pelas ruas centrais de Johannesburg reparei que os homens andam de mãos dadas. Isso mesmo. Da mesma forma que os brasileiros temos o hábito de andar uns com o braço por sobre os ombros dos amigos, especialmente quando precisamos contar algo ao pé do ouvido, eles andam de mãos dadas e… de dedos trançados.
E eu, cheio de frescura pra andar pelas ruas de Porto Alegre de mãos dadas, com os dedos trançados com o amor da minha vida. Não vá perder seu tempo como eu fiz, com bobagens. Rasgue o peito e deixe voar esse amor que está enjaulado aí dentro. Hoje é o melhor dia do ano pra fazer isso. Não deixe pra depois. Ame e seja amado. Você merece, aquela pessoa especial também. O mundo fica melhor com mais pessoas se amando. Feliz noite de Santo Antonio a todos!

sábado, 8 de junho de 2019

5 Anos Sem o Ídolo

Originalmente publicado em 8/6/2014

O ídolo não é um amigo íntimo que frequenta nossa casa, ou nós a dele. É uma referência em algo que faz e que gostaríamos fosse tomada como exemplo pelos outros, por nossos filhos até. A exceção é quando este ídolo é o pai, que está conosco desde que viemos ao mundo e cujos passos tentamos seguir, tentando trilhar uma caminhada tão edificante quanto o exemplo que ele deu. Mesmo assim, na maioria dos casos, ele acaba partindo e resta um vazio naquela mesa onde tá faltando ele e a saudade dele tá doendo em mim.

Já o ídolo que não nos é íntimo, quando parte, deixa uma tristeza sim, sentimento este que é logo seguido pela sublimação da referência que ele sempre significou. Seguirá com o mesmo brilho, sendo a mesma referência, pois sabemos que ao levantar o luto reverencial, seguiremos olhando as pegadas tão bem alinhadas no caminho que este ser diferente nos mostrou possível.

Os Colorados perdemos neste findi uma referência insuperável. O Capitão do time que nos deu a glória máxima de um Título Mundial. Aos 36 anos, rico, boa pinta, um atleta que sabia usar as palavras, um líder dentro e fora de campo, além de jogador com qualidades definitivas. Fernandão, o cara tangível, não está mais entre nós para pegarmos um autógrafo ou tirarmos uma "selfie" a seu lado, mas seu exemplo, sua referência estará sempre mostrando o caminho, nossa senda de vitórias, Colorado das glórias, orgulho do Brasil.


Valeu Capitão!!!

segunda-feira, 3 de junho de 2019

Saudade Até Que É Bom

   Súbita saudade da época em que passava tanto tempo ouvindo rádio que decorava quase todos os jingles publicitários. “Saco, sacou, Saco e Cuecão… Moinhos, Salgado e Malcom” era a assinatura de todas as campanhas de uma rede de moda jovem que não está mais por aí.

   Tentaram lançar um jornal vespertino pra concorrer com a Folha da Tarde e lá veio o jingle: “papel sem qualidade me limpa toda tarde quero Hoje, vou limpar com ele… as piranhas na polícia, os travestis a putaria em geral; vou cagando e limpando em minhas mãos está um cocô de jornal”, claro essa era a corruptela do canção alardeada nas rádios e TV, mas foi a que ficou na cabeça e deve ter contribuído para o insucesso do vespertino.

  “USTóóópe, desbota e perde o vinco… denin indigo blue” a marca de uma calça que fez a transição do brim coringa para o jeans no Brasil daquela geração que cantava “hoje existe tanta gente que quer nos modificar, não quer ver nossos cabelos assanhados com jeito, nem quer ver a nossa calça desbotada o quê que há, se o amigo está nessa ouça bem: NÃO TÁ COM NADA!”

  Era o comércio pressionando a liberação de costumes contidos por uma ditadura que já respirava por aparelhos e que contra-atacou com um melodrama que tentava resgatar toda aquela moral; “este ano, quero paz no meu coração, quem quiser ter um amigo que me dê a mão, o tempo passa e com ele caminhamos todos juntos sem parar, nossos passos pelo chão vão ficar, marcas do que ficou sonhos que vamos ter, como todo dia nasce novo em cada amanhecer, UOUOU..!” Era mto importante esse “uouuou”, mas o tiro saiu pela culatra e o troço virou troça. Não tinha a força do “Eu te amo meu Brasil, eu te amo, meu coração é de Jesus e meu pulmão da Souza Cruz, eu te amo meu Brasil, eu te amo, ninguém segura os maconheiros do Brasil”, mas também virou gozação.


   Sinto saudades do tempo em que tinha tempo pra ver o tempo passar. A juventude é uma idade horrível que apreciamos apenas no momento em que sentimos saudade dela

sábado, 1 de junho de 2019

Fiz O Que Pude Com Muita Honra

Em 9 de fevereiro nasceu meu pai, Albino Ernesto Poli. Naquela colônia a léguas de qualquer civilização, 3º dos 9 filhos de Giovane e Angela, um lugar chamado Coronel Pillar, entre Garibaldi, Bento Gonçalves, próximo às nascentes do rio Taquari. Aliás, como bom gringo, o pai sempre falou com um sorrisão das pescarias no Taquari, o qual atravessava na mesma balsa que até hj está lá pros lado de Santa Teresa, pegado ao velho alambique cujo dono casou-se com uma prima dele.
Os filhos dos imigrantes italianos sabiam, desde o nascimento, que só teriam comida a custo de trabalho e, apesar disso, não deixavam de frequentar a escola primária ali existente. Só que, pra acordar antes do raiar do sol e sair no barro congelado pela geada da serra gaúcha no inverno, as crianças precisavam de sapatos, que na época custavam caro e eram feitos sob medida. Cansado de apertar os pés nos calçados surrados que herdava do irmão mais velho, o jovem Albino tanto fez que chegou a hora de conquistar o direito de mandar fazer um par sob medida para si próprio. Sabedor de que aquilo custaria um quinhão nada fácil de acumular por meu avô, criou coragem e perguntou ao patriarca o quanto significava para a família. "Custa tanto quanto um burro" explicou o nôno. "Pois eu prefiro o burro" optou meu pai, já que o sapato só serviria por pouco mais de uma ano, pois estava em fase de crescimento e no lombo do animal poderia ir pra escola sem queimar os pés no orvalho congelado. E ainda podia alugar o animal aos vizinhos para ararem suas roças, enquanto ficava dentro da sala de aula.
Assim o seu Poli juntou seu primeiro pé de meia, que o possibilitou a concluir o primário, fazer admissão e se bandear pra Garibaldi, onde foi o único filho a cursar o ginásio e partir pra uma vida diferente da sua origem. Um homem de poucas palavras, mas que devorava 3 jornais diários; que adorava geopolítica, não fumava nem bebia. Adorava o professor Keneth Cooper e caminhava uma hora por dia já no tempo da TV em preto e branco. 
Sempre deu o melhor aos filhos, sem nos mimar nem permitir extravagâncias. Suas únicas exigências: "estudem e não me decepcionem".
Espero não ter decepcionado, pai, pois o senhor segue sendo meu herói